da cultura e da arte do século XX
Tektime
PROPRIEDADE LITERÃRIA RESERVADA
Copyright © 2017 by Marco Lupis Macedonio Palermo de Santa Margherita
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Primeira edição original 2017
Primeira edição 2018
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O jornalista é o histórico do instante
Albert Camus
Para Francesco, Alessandro e Caterina
Introdução
Tertium non datur
Era outono em Milão, naquele distante mês de outubro de 1976 quando, caminhando rapidamente ao longo do Corso Venezia na direção do teatro San Babila, estava para fazer a primeira entrevista da minha vida.
Eu tinha dezesseis anos e junto com o meu amigo Alberto conduzia uma transmissão de informações do pouco original tÃtulo de âSpazio giovaniâ (espaço de jovens), em uma das primeiras rádios privadas italianas, Radio Milano Libera .
Foram realmente anos fantásticos aqueles, onde tudo parecia que podia acontecer e efetivamente ocorria. Anos maravilhosos. Anos terrÃveis. Eram os anos de chumbo , aqueles da contestação dos jovens, dos cÃrculos autogerenciados, das greves na escola, das manifestações que acabavam sempre em violência. Anos de enormes entusiasmos, cheios de um fermento cultural que pareciam querer explodir considerando o fato de serem animados, envolventes, totalizantes. Anos de conflitos e também à s vezes com assassinatos: de um lado os jovens da esquerda, do outro aqueles da direita. Em relação à hoje, era tudo muito simples: ou se ficava de um lado ou do outro. Tertium non datur .
Mas, sobretudo, eram anos em que cada um de nós tinha a impressão e com frequência muito mais que uma simples impressão, de poder mudar as coisas. De conseguir - dentro das minhas possibilidades - fazer a diferença .
Nós, naquela mistura de excitação, cultura e violência, nos moviam na realidade tranquilos. Navegando à vista. Os atentados, as bombas, as Brigadas Vermelhas eram um fundo constante da nossa adolescência - a juventude, de acordo com a idade - mas tudo somado não nos perturbava tanto. TÃnhamos aprendido rapidamente a conviver de um modo não muito diferente daquele que depois, mais adiante, nos anos seguintes, teria encontrado entre as populações que viviam no meio de um conflito ou de uma guerra civil. A sua vida tinha se adaptado à quelas condições extremas, um pouco como a nossa vida na época.
O meu amigo Alberto e eu querÃamos realmente tentar fazer a diferença, por isso, armados de entusiasmos sem limites e muita, muitÃssima imprudência, em uma idade em que os rapazes de hoje passam o tempo a postar selfies em Instagram e a trocar smartphone, nós lÃamos tudo aquilo que nos caÃa nas mãos, participávamos de quermesses musicais - naquele momento mágico no qual o rock nascia e se difundia - aos mega concertos nos parques, nos cineforum.
Por isso, com a cabeça cheia de ideias e um gravador cassete no bolso, nos apressávamos para o teatro San Babila, naquele tarde molhada de outubro de quarenta anos atrás.
O encontro era à s dezesseis horas, aproximadamente uma hora antes que começasse o show da tarde. Nos conduziram para baixo, no subterrâneo do teatro onde se encontravam os camarins dos atores, inclusive aquele reservado ao protagonista. E ali nos esperava o nosso entrevistado, o primeiro da minha "carreira" jornalÃstica: Peppino de Filippo.
Não me lembro muito daquela entrevista e, infelizmente as fitas com as gravações das sessões da nossa transmissão foram perdidas, em uma das inúmeras mudanças na minha vida.
Porém, lembro perfeitamente ainda hoje daquela sutil descarga elétrica, aquele arrepio de energia que precede - os teria sentido depois mil vezes - uma entrevista importante. Um encontro importante, porque cada entrevista é muito mais do que uma simples série de perguntas e respostas.
Peppino de Filippo estava no fim - iria morrer dali a poucos anos - de uma carreira teatral e cinematográfica que até então tinha feito história. Ele nos recebeu sem parar de se maquiar, em frente ao espelho. Foi gentil, cortês e disponÃvel e demonstrou não estar maravilhado por se encontrar em frente a dois rapazes cheios de espinhas. Lembro de seus gestos calmos, metódicos, enquanto estendia a maquiagem da cena, que me pareceu pesada, densa e muito clara. Mas lembro, principalmente, de uma coisa: a profunda tristeza do seu olhar. Uma tristeza que me atingiu intensamente, porque a percebi intensamente. Talvez sentisse que a sua vida estava se encaminhando ao fim ou talvez era apenas a prova que desde sempre se fala dos comediantes, isto é, mesmo fazendo rir a todos, são na realidade as pessoas mais tristes do mundo.