O Último Lugar No Hindenburg - Charley Brindley страница 2.

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Um avião, a voar tão alto, que nem conseguia ouvir os motores a jato. Cheio de bêbados felizes, rumo a uma praia exótica. Centenas de pessoas sem preocupações. Tão alto, que não podem ver esta horrível gaiola de pedra e aço, muito menos uma partícula de uma mulher presa dentro dela.

Ela suspirou, virou à direita e caminhou rapidamente ao longo da lateral do edifício. Quando alcançou uma parede, foi para a esquerda e andou alguns metros. Lá, ela ajoelhou-se para pegar numa pedra que estava na base do muro. Era uma rocha do rio do tamanho de um pacote de cigarros Camel. Lisa e arredondada, com uma pequena secção num lado lascado numa borda. Escondendo-a na mão, ela continuou a andar até à parede externa, elevando-a catorze centímetros acima da cabeça. Parou e olhou para cima, a quatro metros do arame farpado em espiral ao longo do topo. Estavam pendurados sobre uma fileira dupla de vidro partido - restos verdes e castanhos das garrafas de vinho partidas dos trabalhadores de há muito tempo. Encaixados no monte de cimento, os fragmentos irregulares capturavam a luz do sol da manhã e dividiam-na em mil diamantes congelados.

Mesmo que ela tivesse forma de escalar a parede, ter que se contorcer através do arame farpado e sobre o vidro partido seria impossível. Com um cortador de arame, poderia cortá-lo e usá-lo para arrancar o vidro partido. Mas minúsculas pontas de vidro ainda saíam do cimento. Talvez com um cobertor grosso para espalhar sobre o vidro..., mas também não tinha um. Mesmo que subisse o muro, e depois? Seria uma queda de quatro metros do outro lado, talvez mais. Talvez muito mais. Ela sabia que o local estava construído na encosta de uma montanha, porque os picos de neve erguiam-se por trás da estrutura de granito cinzenta. Podia até haver um penhasco por baixo do muro.

Ela foi em frente, depois encarou a parede. Olhou para a linha de Xs por um momento. Usando a borda da sua pedra, ela fez um traço de um novo X no fim da linha. Sabia que ele completaria o X quando saísse à tarde.

Ela decidira há muito tempo que, se dois Xs seguidos continuassem incompletos e a faísca desaparecesse da janela dele, ela acabaria com a sua vida.

Seria suficientemente fácil. Parar de comer. Deitar a comida pela sanita abaixo. Os carcereiros nunca saberiam até que fosse tarde demais para salvá-la da fome.

Ou ela podia atacar Lurch na hora do exercício, forçando-o a abrir fogo. Um final rápido seria preferível a dez dias a morrer à fome.

Se tentasse passar fome, eles poderiam levar o seu corpo inconsciente para a enfermaria e reanimá-la com uma alimentação intravenosa. Não. Era melhor deixar Lurch matá-la com a sua Kalashnikov.

Ela contou os Xs; dezanove. A linha acima tinha vinte, e a outra acima também. Ela deu um passo atrás e olhou para as filas e filas de Xs. Os Xs na secção da esquerda do muro começaram a desaparecer.

Três mil setecentos e dezanove Xs. Um por cada dia do seu cativeiro.

Ela olhou para o edifício. Olhando para cima, viu o terceiro andar; o seu andar. Depois, para o sexto andar; o andar dele. Ela contou as janelas com grades à direita... sete... oito... nove. Ali está. A janela dele. Olhou atentamente. Então elaviu - um rápido brilho de luz. Como ele o fez, ela não sabia, mas mesmo em dias nublados, ele dava-lhe este sinal subtil. Não foi muito, apenas uma pequena faísca, mas toda a sua existência estava centrada neste momento, nesta fração de segundo dos milhares de dias que lhe diziam que ele ainda estava vivo, que a amava e que de alguma forma aguentariam esta provação juntos.

Ela levou a pedra aos lábios, mantendo os olhos na janela, sabendo que ele a observava, tal como ela o observava à tarde, quando ele fazia o mesmo ritual.

Ela não se atreveu a fazer outro sinal a não ser tocar com a pedra nos lábios, para que ninguém a visse e soubesse que estavam a comunicar-se.

Havia mais prisioneiros lá. Quantos, ela não sabia, mas sentiu centenas de olhos em si. Todos homens, exceto um. Pelo menos ela gostava de pensar que algures nesta imensa e terrível prisão conhecida como KauenBogdanovka havia outra mulher. Havia algo inquietante em ser uma mulher, sozinha com centenas de homens, mesmo em isolamento.

Apenas ela e o marido usavam este pátio em particular. Havia dois pátios maiores à esquerda e à direita, para onde os outros prisioneiros eram enviados em grupos. Ela não podia vê-los, mas ouvia os seus gritos enquanto praticavam desporto ou brigavam uns com os outros.

O porquê de estarem isolados, ela não sabia. Talvez fossem demasiado valiosos para serem expostos à violência dos outros prisioneiros. Ela certamente não se sentia valiosa.

As celas ficavam embutidas e mantidas na escuridão durante o dia, para que ela não pudesse ver através delas no pátio de exercícios.

O que eu daria por uma conversa de cinco minutos com uma mulher - ou com Lurch, já agora - mesmo que ele não fale inglês, o que é provável. Talvez o idioma dele seja o Turco ou o Russo.

Ela foi pela parede externa até chegar ao fim. Virando à esquerda, foi em direção ao prédio, onde virou outra vez à esquerda e passou pela porta. Outra vez pela esquerda e deu mais alguns passos. Ali, voltou a colocara pedra no seu lugar.

A sua t-shirt gasta, com uma imagem desvanecida e vermelha do Che Guevara não tinha mangas, mas ela fez um movimento como se estivesse mesmo a puxaruma manga. Repetiu o mesmo gesto peculiar no outro braço, como se estivesse a preparar-se para se ocupar de algo.

Ela deu meio passo para a esquerda e, seguindo o caminho anterior, avançou, meio passo no seu último percurso. Todo o caminho em volta do pátio de exercícios e de volta ao rio de pedra, contornando e continuando à volta do perímetro minúsculo até que alcançou o centro do pátio. Lá, ela enfrentou a porta de metal cinzenta, a seis metros de distância. Após dar uma vista de olhos ao sexto andar, foi em direção à porta. Como se de uma sugestão se tratasse, esta abriu-se.

* * * * *

De volta à cela, ela pôs-se perto do beliche, de costas para a parede. Olhou atentamente para a parede oposta.

Levou quatro meses para aprender o truque. Anos atrás, aos dezassete anos, ela observou os dançarinos de rua na cidade de Nova Iorque a representarem a mesma rotina, por isso sabia que aquilo era possível. Exigia concentração, velocidade e força nas pernas. Nas primeiras vezes em que tentou, caiu dura no asfalto, ferindo os cotovelos e os ombros.

Concentrou-se nas duas marcas de arranhões na parede, depois agachou-se e correu em direção a elas. Deu um salto e pousou o pé esquerdo na primeira marca de arranhão, dois metros e meio acima do chão. Usando o seu impulso, levou o pé direito à segunda marca de arranhão e afastou-se. Virou-se no ar e, com os braços estendidos, aterrou de pé, de frente para a parede onde as duas marcas de arranhões davam a impressão empoeirada dos seus pés descalços. Curvou-se e fez piruetas para a sua audiência invisível.

Recuando, ela encostou-se à parede ao lado da sua cama. Apósinspirar fundo, ela correu novamente para a parede oposta.

Era um truque ridículo, sabia-o, mas era apenas uma das muitas rotinas inúteis que executava todos os dias. Teve que preencher o seu tempo com atividade, qualquer que fosse; caso contrário, o silêncio e o isolamento levá-la-iam à loucura.

Após mais três escaladas na parede, ela caiu no chão para fazer flexões com uma mão.

Este exercício também levara meses para ser aperfeiçoado. Quando foram presos, ela e o marido estavam em boas condições físicas; tinham que estar na sua profissão.

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