Não quando eles tinham acabado de ver o mundo praticamente a acabar, com as pessoas a agruparem-se enquanto naves alienígenas passavam sobre elas. Ao lado dele, Luna olhava fixamente para os monitores como se esperasse que eles voltassem a qualquer momento, ou talvez apenas porque ela estava a imaginar os seus pais algures lá fora, a entrarem numa nave alienígena.
Kevin colocou um braço ao redor dela, sem ter a certeza se a estava a consolar ou a tentar consolar-se a si próprio.
“Achas que as pessoas estão bem?” Luna perguntou. “Achas que os meus pais estão bem?”
Kevin engoliu em seco, pensando nas pessoas em fila para entrar nas naves. A sua mãe também estaria algures entre essas pessoas.
“Espero que sim” disse ele.
“É injusto” disse Luna. “Nós estamos aqui seguros num bunker, enquanto toda a gente está presa lá fora... quantas pessoas achas que foram convertidas?”
Kevin pensou na vasta maré de pessoas que tinha estado nos ecrãs antes de estes ficarem sem imagem, e nos números cada vez menores de pessoas que lá estavam para informar sobre tudo aquilo.
“Eu não sei, muitas” ele supôs.
“Talvez todas” disse Luna. “Talvez nós sejamos os últimos.”
“Devíamos dar uma volta por aqui e procurar” disse ele. “Talvez consigamos encontrar uma maneira de ligar tudo novamente. E, então, depois podemos ver.”
Ele disse isso tanto para tentar distrair Luna quanto porque achava que eles tinham esperança de o fazer. O que é que eles sabiam sobre arranjar sistemas de computador? Se um dos cientistas do instituto da NASA estivesse lá... talvez a Dra. Levin... mas eles tinham desaparecido, assim como todos os outros. Eles tinham sido transformados pelo vapor, transformando-se em coisas que os tinham perseguido.
“Vamos” disse ele para Luna, puxando-a gentilmente para longe do ecrã. “Precisamos dar uma volta e procurar.”
Luna acenou com a cabeça, embora ela não parecesse estar a compreender tudo naquele momento. “Acho que sim”
Eles partiram pelo bunker sob o Monte Diablo. Kevin olhou em volta, surpreendido pela sua dimensão. Se eles estivessem estado num lugar como este, mas num momento diferente, isto poderia parecer uma aventura. Mas agora, cada passo ecoante lembrava a Kevin o quanto eles estavam sozinhos. Esta era uma base militar inteira, e eles eram os únicos que ali estavam.
“Isto é fantástico” disse Luna, com um sorriso demasiado luminoso para ser real. “Como andar furtivamente pelos armazéns.”
Porém, Kevin percebia que ela estava desanimada. Ela podia estar a esforçar-se ao máximo para ser a velha Luna, mas o que se via não era muito convincente.
“Tudo bem” disse Kevin “para mim não precisas de fingir. Eu estou…”
O que é que ele poderia dizer? Que ele estava triste também? Não parecia o suficiente para conter o fim do mundo, ou a perda de todos os que eles conheciam, ou nada daquilo, na verdade.
“Eu sei” disse Luna. “Eu só estou a tentar ter... esperança, eu acho. Vem, vamos ver o que há por aqui.
Kevin teve a sensação de ela o querer distrair. Então, eles dirigiram-se mais para dentro do bunker. Era um espaço enorme, que parecia ter abrigado centenas de pessoas, se necessário. Havia canos e cabos que iam para as profundezas do bunker e sinais pintados nas paredes com tinta amarela.
“Olha” disse Luna, apontando “há uma cozinha naquela direção.”
Kevin sentiu o estômago a roncar só de pensar nisso e, embora isso não resolvesse todos os outros problemas, os dois partiram na direção indicada pela placa. Eles caminharam por um corredor, e depois por outro, indo dar a uma cozinha que estava construída numa escala industrial. Havia arcas congeladoras na parte de trás, atrás de portas que poderiam ter protegido um cofre, e outras portas que pareciam ir dar a armazéns.
“Devíamos ver se há alguma comida aqui” Luna sugeriu, abrindo uma.
O espaço atrás era ainda maior do que Kevin poderia esperar, cheio de caixas empilhadas. Ele abriu uma e encontrou pacotes selados e prateados que pareciam ter sido guardados para sempre.
“Há aqui comida suficiente para nos alimentar durante toda a vida” disse Kevin, e então percebeu exatamente o que acabara de dizer. “Não é isso… quero dizer, nós podemos não ter que ficar aqui para sempre.”
“Mas e se ficarmos?” Luna perguntou.
Kevin não tinha a certeza se tinha uma boa resposta para isso. Ele não se conseguia imaginar a viver aqui para sempre. Ele mal conseguia imaginar uma noite, quanto mais uma vida inteira, passada num bunker. “Então eu acho que estamos melhor aqui do que lá fora. Pelo menos aqui estamos em segurança.”
“Eu acho que sim” disse Luna, dando uma olhadela nas paredes parecendo avaliar o quão grossas elas eram. “Em segurança, sim.”
“Devíamos ver o que é que há mais aqui” disse Kevin. “Se vamos ficar aqui, vamos precisar de outras coisas. Água, lugares para dormir, ar fresco. Uma maneira de comunicar com o exterior.”
Ele contava-as com os dedos enquanto pensava nelas.
“Também devíamos ver se há outras maneiras de entrar ou sair” disse Luna. “Queremos ter a certeza de que ninguém mais consegue entrar.”
Kevin assentiu, porque isso parecia importante. Eles começaram a revistar o bunker, usando a cozinha como uma espécie de base, indo e voltando entre ela e a sala de controlo principal, que parecia curiosamente silenciosa sem nada nos seus ecrãs.
Havia outro compartimento próximo que estava cheio de equipamentos de comunicações. Kevin viu rádios e computadores. Havia até algo parecido com uma máquina telegráfica antiquada no canto, como se as pessoas de lá não confiassem que poderiam contar com o equipamento mais moderno quando precisassem dele.
“Eles têm tanta coisa” disse Luna, tocando num botão e recebendo uma explosão de ruído branco em resposta.
“Temos tanta coisa agora” salientou Kevin. “Talvez se houver outras pessoas lá fora, consigamos nos comunicar com elas.”
Luna olhou em volta. “Achas que ainda há outras pessoas? E se formos só nós os dois?”
Kevin não sabia o que dizer. Se ele ia ficar ali encurralado como uma das últimas pessoas no mundo, não havia mais ninguém com quem ele preferisse ficar encurralado do que com a sua melhor amiga. Mesmo assim, ele tinha que acreditar que havia outras pessoas algures lá fora. Ele tinha de acreditar.
“Deve haver outras pessoas algures” disse ele. “Existem outros bunkers e outras coisas, e algumas pessoas terão percebido o que estava a acontecer. Havia pessoas a difundir fotos, pelo que elas deviam saber o que estava a acontecer.”
“Mas os ecrãs ficaram em branco” Luna salientou. “Nós não sabemos se elas ainda estão por aí, lá fora.”
Kevin engoliu em seco ao pensar nisso. Ele tinha assumido simplesmente que o sinal acabara de ser cortado, mas e se não fosse o sinal? E se as pessoas que os estavam a enviar também tivessem desaparecido?
Ele abanou a cabeça. “Não podemos pensar assim” disse ele. “Temos que ter esperança que haja mais pessoas lá fora.”
“Pessoas que podem matar os alienígenas” disse Luna, com um brilho severo nos seus olhos. Kevin teve a sensação de que se ela tivesse os meios para lutar contra eles, Luna estaria lá fora, agora mesmo, a tentar enfrentá-los.
Kevin conseguia entender isso. Era uma parte de quem Luna era; uma parte dela que ele gostava tanto. Ele até sentia uma parte da mesma raiva, sentindo-a a borbulhar dentro de si ao pensar que tinha sido enganado pelos alienígenas, e por tudo o que lhe havia sido tirado.
Ele precisava da distração de procurar pelo bunker tanto quanto Luna, porque a alternativa era pensar na sua mãe, nos seus amigos, e em todos os outros que poderiam ter estado sob as naves alienígenas quando estas chegaram.
Eles continuaram a procurar ao redor do bunker, e não demorou muito para que eles encontrassem o que parecia ser uma saída para as traseiras. As palavras “Ambiente Não Selado. Apenas para Saídas de Emergência!” estavam estampadas por cima de uma escotilha que parecia o tubo de torpedo de um submarino, completo com uma grande alça circular que o selava. Não parecia ser suficientemente grande para a maioria das pessoas conseguir rastejar através dele. Claro, para Kevin e Luna significaria muito espaço.