Ele ficou a observar até a carroça parar e ser aberta por soldados com armas numa mão e correntes na outra.
"Prisioneiros saiam", gritou um. "Saiam, ou incendiamos esta carroça com vocês ai dentro, sua escumalha!"
Em desordem juntamente com os outros, Sartes saiu para a luz. Agora ele poderia assimilar todo o horror daquilo. Os vapores do local eram quase avassaladores. Os lagos de betume à volta deles borbulhavam em estranhas e imprevisíveis combinações. Mesmo enquanto Sartes observava, um pedaço de terra perto de um dos lagos cedeu, caindo para dentro do betume.
"Estes são os lagos de betume", anunciou o soldado que tinha falado. "Não te incomodes a tentar habituares-te a eles. Vocês todos irão morrer muito antes de isso acontecer."
A pior parte era que eles talvez tivessem razão, suspeitou Sartes quando eles lhe puseram uma algema no tornozelo.
CAPÍTULO CINCO
Thanos fez deslizar o seu pequeno barco pelo xisto da praia acima, desviando o olhar dos grilhões fixados abaixo da linha da maré. Ele fez o seu caminho até sair da praia, sentindo-se exposto a cada passo que dava na rocha cinzenta daquele lugar. Seria demasiado fácil ser visto ali, e Thanos, definitivamente, não queria ser visto num lugar como aquele.
Ele escalou por um caminho e parou, sentindo a raiva juntar-se à sua repulsa ao ver o que estava ao longo de cada lado do caminho. Estavam ali instrumentos, forcas e espigões, rodas de tortura e cadafalso, todos, obviamente, destinados a dar uma morte desagradável para aqueles que lá estavam. Thanos tinha ouvido falar da Ilha dos Prisioneiros, mas mesmo assim, a crueldade daquele lugar tinha feito com que ele o quisesse destruir completamente.
Ele continuou pelo caminho acima, a pensar em como seria para qualquer um que fosse levado lá para baixo, cercado por paredes rochosas e sabendo que só a morte o aguardava. Tinha Ceres realmente acabado naquele lugar? Pensar nisso era o suficiente para Thanos sentir um nó no estômago.
À frente, Thanos ouviu gritos, vaias e lamúrias que quase pareciam como se fossem tanto de animais como de humanos. Houve algo naquele som que o fez congelar, com o seu corpo a dizer-lhe para estar pronto para a violência. Apressou-se a sair do caminho, levantando a cabeça acima do nível das rochas que bloqueavam a sua visão.
O que ele viu para lá das rochas fê-lo ficar pasmado a olhar. Um homem estava a correr, com os pés descalços que deixavam manchas de sangue no chão de pedra. Ele usava roupas que estavam rasgadas e despedaçadas, com uma manga solta do ombro e uma grande racha nas costas que mostrava uma ferida por baixo. Ele tinha o cabelo selvagem e uma barba ainda mais selvagem. Apenas o fato de as suas roupas rasgadas serem de seda mostrava que ele não tinha vivido de uma forma selvagem toda a sua vida.
O homem atrás dele parecia, se alguma coisa, ainda mais selvagem. Havia algo nele que fazia com que Thanos se sentisse como a presa de um qualquer animal enorme apenas a olhar para ele. Ele usava uma mistura de couros que parecia terem sido roubados de uma dúzia de diferentes fontes, e tinha manchas de lama num padrão que Thanos suspeitava ter sido desenhado para que ele se misturasse com a floresta. Ele segurou um taco e uma adaga pequena, e os gritos que emitia, enquanto perseguia o outro homem faziam com que Thanos ficasse com os cabelos em pé.
Por instinto, Thanos começou a avançar. Ele não podia ficar de braços cruzados a assistir a alguém a ser assassinado, até mesmo ali, onde todos os que tinham sido para lá enviados tinham cometido algum crime. Ele desatou a correr subida acima, descendo depois até um local onde os dois passariam a correr. O primeiro dos homens esquivou-se à sua volta. O segundo parou com um sorriso de dentes afiados.
"Parece que temos outro para apanhar", disse ele, investindo contra Thanos.
Thanos reagiu com a velocidade de quem treina há muito, desviando-se a balançar do primeiro golpe de faca. O taco apanhou-a no ombro, mas ele ignorou a dor. Ele rodou o seu punho bruscamente, sentindo o impacto ao ligar-se à mandíbula do outro homem. O homem selvagem caiu, ficando inconsciente antes de bater no chão.
Thanos olhou em volta e viu o primeiro homem a olhar para ele.
"Não te preocupes", disse Thanos, "Eu não te vou magoar. Chamo-me Thanos."
"Herek", disse o outro homem. Para Thanos, a sua voz parecia enferrujada, como se ele não falasse com ninguém há muito tempo. "Eu…"
Outro grito surgiu de trás na direção da área arborizada da ilha. Parecia serem muitas vozes reunidas em algo que mesmo a Thanos lhe parecia aterrador.
"Rápido, por aqui."
O outro homem agarrou o braço de Thanos, puxando-o para uma série de rochas mais altas. Thanos seguia, agachando-se num espaço que não conseguia ser visto do caminho principal, mas onde eles ainda conseguiam ver sinais de perigo. Enquanto estavam ali agachados, Thanos conseguia sentir que o outro homem estava com medo. Ele tentava ficar o mais imóvel possível.
Thanos desejava que lhe tivesse ocorrido apanhar a faca do homem que ele tinha atirado ao chão, mas já era tarde demais para isso. Em vez disso, apenas lhe restava ficar ali enquanto eles esperavam que os outros perseguidores descessem ao local onde eles tinham estado.
Ele viu-os a aproximarem-se em grupo, e nenhum deles era igual. Todos tinham armas que obviamente tinham sido feitas com qualquer coisa que tivessem à mão, enquanto aqueles que ainda usavam mais do que simples pedaços de roupa vestiam uma estranha mistura de coisas, obviamente roubadas. Havia homens e mulheres ali, que pareciam esfomeados e perigosos, meio-famintos e ferozes.
Thanos viu uma das mulheres a tocar o homem inconsciente com o seu pé. Naquele momento, ele sentiu um arrepio de medo, porque se o homem acordasse, ele poderia dizer aos outros o que tinha acontecido, e isso ia pô-los à procura.
No entanto, ele não acordou, porque a mulher ajoelhou-se e cortou-lhe a garganta.
Thanos ficou tenso com aquilo. Ao seu lado, Herek colocou-lhe a mão no braço.
"Os Abandonados não têm tempo para fraquezas de qualquer tipo", sussurrou ele. "Eles atacam qualquer um que consigam, porque aqueles lá em cima na fortaleza não lhes dão nada."
"Eles são prisioneiros?", perguntou Thanos.
"Todos nós somos prisioneiros aqui", respondeu Herek. "Até mesmo os guardas são simplesmente presos que subiram ao topo e que apreciam a crueldade o suficiente para fazer o trabalho do Império. Só que tu não és um prisioneiro, pois não? Tu não pareces ter passado pela fortaleza."
"Não sou", admitiu Thanos. "Este lugar... são prisioneiros a fazer isto a outros prisioneiros?"
O pior era que ele conseguia imaginar. Era o tipo de coisa que o rei, o seu pai, podia pensar. Colocar prisioneiros numa espécie de inferno e, depois, dar-lhes a hipótese de evitar mais dor apenas caso eles comandassem aquilo.
"Os Abandonados são os piores", disse Herek. "Se os prisioneiros não se subjugarem, se eles forem muito loucos ou muito teimosos, se não trabalharem ou ripostarem muito, são mandados para aqui sem nada. Os guardas perseguem-nos. A maioria implora para ser trazida de volta."
Thanos não queria pensar sobre isso, mas tinha de o fazer, porque Ceres poderia estar ali. Ele mantinha os olhos no grupo de prisioneiros selvagens enquanto continuava a sussurrar para Herek.
"Eu estou à procura de uma pessoa", disse Thanos. "Ela talvez tenha sido trazida para aqui. O nome dela é Ceres. Ela lutou no Stade."
"A princesa lorde de combate", sussurrou-lhe Herek. "Eu vi-a a lutar no Stade. Mas não, eu teria sabido se ela tivesse sido trazida para aqui. Eles gostavam de fazer desfilar os recém-chegados à nossa frente, para que eles pudessem ver o que os esperava. Eu ter-me-ia lembrado dela."