“Melhor passar fome e frio do que ser pego por comerciantes de escravos,” ele fala.
Penso na casa de meu pai, rio acima. Vamos passar bem ao lado dela. Lembro-me da minha promessa à minha cachorra, Sasha, de enterrá-la. Também penso em toda a comida que havia lá, na casinha de pedra – poderíamos pegá-la, iria nos sustentar por dia. Penso nas ferramentas na garagem de papai, em todas as coisas que seriam úteis. Sem falar das roupas extras, lençóis e fósforos.
“Quero fazer uma parada.”
Logan se vira e olha para mim como se eu fosse louca. Posso ver que ele desaprova minha ideia.
“Do que você está falando?”
“Sobre a casa de meu pai. Em Catskill. Cerca de uma hora ao norte daqui. Quero passar por lá. Há muitas coisas que podemos resgatar. Coisas que iremos precisar. Como comida. E…” eu pauso, “eu quero enterrar minha cachorra.”
“Enterrar sua cachorra?” ele pergunta, sua voz ficando mais alta. “Você enlouqueceu? Você quer que todos nós sejamos mortos por isso?”
“Eu lhe prometi,” eu digo.
“Prometeu?” ele retruca. “A sua cachorra? Morta? Você está brincando.”
Eu o encaro e ele percebe rapidamente que não estou.
“Se eu prometo algo, eu cumpro. Eu enterraria você se eu prometesse.”
Ele balança a cabeça.
“Ouça,” eu falo seriamente. “Você queria ir para o Canadá. Poderíamos ter ido para qualquer lugar. Esse era o seu sonho. Não meu. Quem sabe se essa cidade realmente existe? Estou seguindo você por um capricho seu. E este barco não é só seu. Eu só quero passar na casa de meu pai. Pegar algumas coisas que precisamos e enterrar minha cachorra. Não vai demorar muito. Estamos bem à frente dos comerciantes de escravos. Sem mencionar que temos uma pequena vasilha de combustível lá. Não é muito, mas vai ajudar.”
Logan lentamente balança sua cabeça.
“Prefiro não pegar esse combustível e não correr tanto risco. Você está falando das montanhas. Está falando de uns trinta quilômetros terra adentro, não é? Como acha que chegaremos lá após pararmos nas docas? Escalando?”
“Eu sei que tem um caminhão velho. Uma picape surrada. É só uma carcaça enferrujada, mas anda e tem combustível suficiente para nos levar e nos trazer de volta. Está escondida próxima à beira do rio. O rio nos levará até lá. O caminhão nos levará e nos trará de volta. Será rápido. E então continuaremos nossa longa jornada para o Canadá. Será o melhor para nós.”
Logan observa a água silenciosamente por um longo tempo, seus punhos fechados firmemente em volta do timão.
Por fim, ele diz, “Tanto faz. É a sua vida em risco. Mas eu vou ficar no barco. Você terá duas horas. Se não voltar a tempo, irei embora.”
Eu lhe dou as costas e olho para a água, furiosa. Queria que ele fosse comigo. Sinto que ele só pensa nele mesmo e isso me deixa desapontada. Pensei que ele fosse melhor que isso.
“Então, você só se importa consigo mesmo, é isso?” eu pergunto.
Também me preocupa que ele não queira me acompanhar até a casa de meu pai; Não havia pensado nisso. Sei que Ben não vai querer ir eu gostaria de ter um pouco de proteção. Que seja. Eu ainda estou determinada. Fiz uma promessa e irei cumpri-la. Com ou sem ele.
Ele não responde e posso ver que está aborrecido.
Contemplo a água, evitando olhá-lo. À medida que a água se agita em meio ao constante barulho do motor, percebo que estou brava não somente porque estou decepcionada com ele, mas também porque eu comecei a gostar dele, a contar com ele. Eu não dependia de ninguém havia muito tempo. É um sentimento assustador depender de alguém de novo, me sinto traída.
“Brooke?”
Meu coração se alivia com o som de uma voz familiar e eu me viro para ver minha irmãzinha acordar. E Rose também. As duas são como ervilhas de uma vagem, extensões de uma única pessoa.
Eu ainda mal consigo acreditar que Bree está aqui, novamente comigo. É como um sonho. Quando ela foi sequestrada, uma parte de mim estava certa de que eu jamais a veria de novo. Cada momento em que estou com ele, sinto como se tivesse recebido uma segunda chance, estou mais determinada do que nunca a cuidar dela.
“Estou com fome,” Bree fala, esfregando seus olhos com a parte de trás de suas mãos.
Penélope senta-se no coo de Bree. Ela não pára de tremer e então levanta seu olho bom em minha direção, como se dissesse que também está faminta.
“Estou congelando,” Rose ecoa, esfregando seus ombros. Ela veste apenas uma fina camiseta e eu me sinto muito mal por ela.
Eu compreendo. Estou com fome e com frio também. Meu nariz está vermelho e eu mal posso senti-lo. Essas guloseimas que encontramos eram deliciosas, mas pouco nutritivas – especialmente em um estômago vazio. E isso aconteceu horas atrás. Penso de novo no baú de comidas, no pouco que restou e me pergunto em quanto tempo ele ficará vazio. Sei que deveria racionar a comida. Por outro lado, estamos todos passando fome e não suporto ver Bree desse jeito.
“Não sobrou muita comida,” eu digo a ela, “mas posso dar a vocês um pouquinho agora. Temos alguns biscoitos e biscoitos água e sal.”
“Biscoitos!” elas gritam em uníssono. Penélope late.
“Eu não faria isso,” ouço a voz de Logan ao meu lado.
Olho para o lado e o vejo com um olhar de desaprovação.
“Precisamos racionar.”
“Por favor!” Bree grita. “Preciso de alguma coisa. Estou com fome.”
“Eu preciso dar a ela alguma coisa,” digo firmemente a Logan, entendo sua opinião, mas fico aborrecida com sua falta de compaixão. “Eu vou dar apenas um biscoito para cada um de nós.”
“E quanto à Penélope?” Rose pergunta.
“O cachorro não vai pegar nenhuma comida nossa,” Logan retruca. “Ela tem que se virar sozinha.”
Sinto-me, mais uma vez, aborrecida com Logan, apesar de entender que ele está sendo racional. Mesmo assim, quando vejo o olhar cabisbaixo em Rose e em Bree e ouço o latido de Penélope mais uma vez, não conseguirei o deixá-la passando fome. Eu disfarçadamente lhe darei um pouco de comida da minha própria parte.
Abro o baú e dou uma olhada em nosso estoque de comida. Vejo duas caixas de biscoitos, três pacotes de biscoitos água e sal, vários sacos de ursinhos de gelatina e meia dúzia de barras de chocolate. Gostaria que houvesse alguma comida mais nutritiva, não sei como faremos para isso durar, como isso será suficiente para três refeições por dia para cinco pessoas.
Eu tiro os biscoitos e dou um para cada um. Ben finalmente sai do seu lugar ao ver comida e aceita a sua porção. Ele tem círculos escuros abaixo dos olhos, como se não tivesse dormido. É penoso ver sua expressão, tão devastada pela perda de seu irmão, desvio meu olhar ao lhe entregar seu biscoito.
Vou para a frente do barco e dou a Logan a sua parte. Ele pega o biscoito e, silenciosamente, o coloca em seu bolso, claro, vai guardá-lo para mais tarde. Não sei de onde ele tira tanta força. Eu enfraqueço só de sentir o cheiro de biscoitos de chocolate. Sei que eu deveria racionar comida também, mas não consigo. Mordo um pedaço pequeno, decidida a guardá-lo para mais tarde – mas é tão delicioso que não consigo me conter – eu o devoro inteiro, deixo apenas um pedacinho, o qual reservo para Penélope.
A comida me faz sentir tão bem. O açúcar sobe a minha cabeça e atravessa meu corpo, gostaria de poder comer mais uma dúzia. Respiro fundo quando meu estômago reclama, tentando me controlar.
O rio começa a se estreitar, as margens se aproximam uma da outra à medida que rio serpenteia. Estamos perto de terra firme e fico bem atenta, analisando a margem, à procura de qualquer sinal de perigo. Quando fazemos uma curva, olho para minha esquerda e vejo, no alto de um penhasco, as ruínas de uma antiga fortificação, agora bombardeada. Fico chocada quanto percebo o que era antes.
“A Academia Militar,” Logan fala. Ele deve ter notado ao mesmo tempo que eu.
É impactante ver que este bastião da força americana é agora apenas uma pilha de destroços, seu mastro da bandeira está retorcido, pendurado sobre o Hudson. Quase nada é igual ao que já foi antes.