Steffen assentiu.
"Eu vou esperar por ti aqui", disse ele, "e se houver algum problema lá dentro, eu vou ter contigo."
"Se eu não encontrar o que preciso dentro daquela torre", ela respondeu: "receio que vamos ter muitos mais problemas."
*
Gwen caminhou lentamente sobre a ponte levadiça, com Krohn ao lado dela. Os seus passos ecoavam na madeira à medida que ela atravessava as águas que suavemente ondulavam por baixo de si. Ao longo de toda a ponte dezenas de monges estavam alinhados, completamente atentos, em silêncio, usando mantos escarlate, com as mãos escondidas lá dentro, e de olhos fechados. Eles eram um estranho lote de guardas, desarmados, incrivelmente obedientes. Gwen não sabia há quanto tempo eles montavam ali guarda. Ela estava maravilhada com a sua intensa lealdade e devoção ao seu líder, e ela percebeu que era como dizia o Rei: todos o veneravam como um deus. Ela questionou-se onde é que se estava a meter.
Ao aproximar-se, Gwen olhou para as enormes portas em arco que surgiram diante de si, feitas de carvalho antigo, inscritas com símbolos que ela não entendia. Ela observou maravilhada vários monges a aproximarem-se e a abrirem-nas. Elas rangeram, revelando um interior sombrio iluminado apenas por tochas. Uma corrente de ar frio foi ao seu encontro, cheirando levemente a incenso. Krohn ficou entorpecido ao seu lado, a rosnar, e Gwen entrou e ouviu a porta bater atrás de si.
O som ecoou no interior. Gwen demorou um pouco a orientar-se. Estava escuro ali dentro, as paredes estavam iluminadas apenas por tochas e pela luz solar filtrada que entrava através de vitrais lá no alto. O ar ali sentia-se sagrado, silencioso, e ela sentia como se tivesse entrado numa igreja.
Gwen olhou para cima e viu que a torre tinha uma espiral muito alta, com rampas graduais e circulares que levavam até aos pisos. Não havia janelas e as paredes ecoavam com o som fraco de cânticos. O incenso pairava pesado no ar e os monges apareciam e desapareciam a todo o tempo, caminhando como em transe para dentro e para fora dos aposentos. Alguns libertavam incenso e alguns ecoavam cânticos, enquanto outros ficavam em silêncio, perdidos a refletir. Gwen indagava-se ainda mais sobre a natureza deste culto.
"O meu pai mandou-te?", ecoou uma voz.
Gwen, assustada, virou-se e viu um homem ali a pouca distância, vestindo um longo manto escarlate, sorrindo para ela afavelmente. Ela mal podia acreditar o quanto ele se parecia com o seu pai, o Rei.
"Eu sabia que ele iria enviar alguém, mais cedo ou mais tarde", disse Kristof. "Os seus esforços para me trazer de volta ao seu redil são infinitas. Por favor, vem", acenou ele, voltando-se para o lado e gesticulando com a mão.
Gwen colocou-se ao lado dele enquanto caminhavam por um arqueado corredor de pedra, subindo gradualmente a rampa em círculos até aos níveis mais altos da torre. Gwen viu-se apanhada desprevenida; ela esperava um monge louco, um fanático religioso, e ficou surpreendida ao encontrar alguém afável e bem-humorado, e, claramente, no seu perfeito juízo. Kristof não parecia ser a pessoa perdida e louca que o seu pai tinha feito crer.
"O teu pai chama por ti", disse ela finalmente, quebrando o silêncio depois de eles passarem por um monge que caminhava pela rampa na direção oposta sem nunca ter levantado o olhar do chão. "Ele quer que eu te leve para casa."
Kristof abanou a cabeça.
"Esse é o problema do meu pai", disse ele. "Ele acha que encontrou a única verdadeira casa no mundo. Mas eu aprendi algo", acrescentou ele, de frente para ela. "Há muitas verdadeiras casas neste mundo."
Ele suspirou e eles continuaram a andar. Gwen queria dar-lhe o seu espaço, não querendo pressionar demasiado.
"O meu pai nunca iria aceitar quem eu sou", acrescentou ele finalmente. "Ele nunca vai aprender. Ele permanece preso nas suas velhas e limitadas crenças - e ele quer impô-las em mim. Mas eu não sou ele - e ele nunca vai aceitar isso."
"Não sentes falta da tua família?", perguntou Gwen, surpreendida por ele entregar a sua vida àquela torre.
"Sinto", respondeu ele com sinceridade, surpreendendo-a. "Muito. A minha família é tudo para mim - mas a minha vocação espiritual ainda é mais. A minha casa é aqui agora", disse ele, virando num corredor enquanto Gwen o seguia. "Eu agora sirvo Eldof. Ele é o meu sol. Se o conhecesses", disse ele, voltando-se e olhando para Gwen com uma intensidade que a assustou, "ele também seria o teu."
Gwen desviou o olhar, não gostando da aparência do fanatismo nos seus olhos.
"Eu não sirvo mais ninguém além de mim mesma", respondeu ela.
Ele sorriu para ela.
"Talvez seja essa a fonte de todas as tuas preocupações terrenas", respondeu ele. "Ninguém pode viver num mundo onde não sirva outra pessoa. Neste momento, estás a servir outra pessoa."
Gwen olhou para ele desconfiada.
"Como assim?", ela perguntou.
"Mesmo se pensas que te serves a ti mesma", respondeu ele, "estás enganada. A pessoa que estás a servir não és tu, mas sim a pessoa que os seus pais moldaram. É os teus pais que tu serves - e todas as suas velhas crenças, transmitida pelos pais deles. Quando é que vais ter coragem suficiente para te livrares das suas crenças e servir-te?"
Gwen franziu a testa, não comprando a sua filosofia.
"E assumir então as crenças de quem?", perguntou ela. "De Eldof?"
Ele abanou a cabeça.
"Eldof é meramente um canal", ele respondeu. "Ele ajuda a descartares quem tu eras. Ele ajuda-te a encontrar o teu verdadeiro eu, tudo o que estavas destinada a ser. É a quem deves servir. É quem nunca vais descobrir até que o teu falso eu seja libertado. É isso que Eldof faz: ele liberta-nos a todos.”
Gwendolyn olhava para os seus olhos brilhantes e conseguia ver quão devotado ele era - e aquela devoção assustava-a. Ela poderia dizer imediatamente que ele estava para além da razão, que ele nunca iria deixar aquele lugar.
Era assustador, a teia que aquele Eldof tinha tecido para atrair todas aquelas pessoas e prendê-las ali – uma qualquer filosofia barata, com uma lógica só para si. Gwen não queria ouvir mais nada; era uma teia que ela estava determinada a evitar.
Gwen virou-se e continuou a caminhar, sacudindo aquilo com um arrepio, continuando pela rampa acima, circundando a torre, subindo gradualmente cada vez mais, onde quer que a rampa os estivesse a levar. Kristof estava ao lado dela.
"Eu não vim para discutir os méritos do teu culto", disse Gwen. "Eu não te posso convencer a voltar para o teu pai. Prometi perguntar, e fi-lo. Se tu não valorizas a tua família, não posso ensinar-te a valorizá-la."
Kristof olhou para ela com gravidade.
"E achas que o meu pai valoriza a família?", perguntou.
"Muito", respondeu ela. "Pelo menos do que eu consigo ver."
Kristof abanou a cabeça.
"Deixa-me mostrar-te uma coisa."
Kristof agarrou-a pelo cotovelo e levou-a por outro corredor para a esquerda, depois subiram um longo lanço de escadas, parando diante de uma grossa porta de carvalho. Ele olhou para ela seriamente e, em seguida, abriu-a, revelando um conjunto de barras de ferro.
Gwen ficou ali, curiosa, nervosa para ver o que quer que fosse que ele lhe queria mostrar - então ela aproximou-se e olhou através das grades. Ela ficou horrorizada ao ver uma menina jovem, bonita, sentada sozinha numa cela, a olhar pela janela, com o seu longo cabelo à frente do rosto. Embora os seus olhos estivessem abertos, ela parecia não tomar conhecimento da presença deles.
"É assim que o meu pai se importa com a família", disse Kristof.
Gwen olhou para ele, curiosa.
"A família dele?", perguntou Gwen, atordoada.
Kristof assentiu.
"Kathryn. A sua outra filha. A que ele esconde do mundo. Ela tem sido relegada para aqui, para esta cela. Porquê? Porque ela é demente. Porque ela não é perfeita, como ele. Porque ele tem vergonha dela."