A carroça ainda se movia, mas já não sacudia tanto. Isso podia significar uma coisa: uma estrada melhor. Eles deviam estar perto de uma cidade. Thor olhou para baixo e viu como a estrada era suave, livre de pedras, de buracos e bordejada com belas e brancas conchas marinhas. Seu coração acelerou; eles estavam se aproximando da corte do rei.
Thor olhou para fora da parte traseira da carroça e estava avassalado. As ruas imaculadas estavam fervilhando de atividade. Dezenas de charretes, de todas as formas e tamanhos e carregando todos os tipos de coisas, enchiam as estradas. Uma estava carregada com peles; outra com tapetes; e ainda outra com galinhas. Entre elas caminhavam centenas de comerciantes, alguns conduziam gado, outros carregavam cestas de mercadorias em suas cabeças. Quatro homens carregavam rolos de sedas, equilibrando-os em seus suportes. Era um exército de pessoas, indo na mesma direção.
Thor se sentia vivo. Ele nunca tinha visto tantas pessoas ao mesmo tempo, tantas mercadorias, tanta coisa acontecendo. Ele tinha estado em uma pequena aldeia sua vida inteira e agora ele estava no centro das atividades, tragado pela humanidade.
Ele ouviu um barulho forte, um ruído produzido por correntes, a batida de um enorme pedaço de madeira, que de tão forte fez a terra tremer. Momentos depois, se ouviu um som diferente, era o dos cascos dos cavalos batendo na madeira. Ele olhou para baixo e percebeu que estavam atravessando uma ponte; abaixo deles havia um fosso. Uma ponte levadiça.
Thor colocou a cabeça para fora e viu os imensos pilares de pedra e o portão de ferro recoberto por espigões. Eles estavam passando pelo Portão do Rei.
Era o maior portão que ele já tinha visto. Ele olhou para os espigões, imaginado que se eles viessem abaixo, poderiam cortá-lo ao meio. Ele detectou quatro dos soldados do Exército Prata guardando a entrada e seu coração acelerou.
Eles passaram por um longo túnel de pedra e então, momentos depois o céu abriu novamente. Eles estavam dentro da corte do rei.
Thor mal podia crer. Havia ainda mais atividade ali, se é que isso era possível – o que parecia ser milhares de pessoas, em todas as direções. Havia grandes extensões de grama, perfeitamente cortada, flores desabrochando em todos os lugares. O caminho se ampliava e ao longo dele barracas, vendedores e edifícios de pedra. E no meio de todos eles, os homens do rei. Soldados, revestidos com suas armaduras. Thor havia conseguido. Em seu entusiasmo, ele se levantou involuntariamente; quando ele fez isso, a carroça freou bruscamente, lançando-o para trás fazendo o cair e desabar de costas na palha. Antes que ele pudesse levantar-se, ouviu o som da madeira arriando, ele olhou para cima para ver um velho zangado, careca, vestido com trapos e bem carrancudo. O cocheiro se aproximou, agarrou Thor pelos tornozelos com suas mãos ossudas e o arrastou para fora.
Thor foi arremessado, caindo pesadamente de costas na estrada poeirenta, levantando uma nuvem de poeira. Ao redor dele todos davam gargalhadas.
“Da próxima vez que você pegar carona na minha carroça garoto, haverá um par de algemas esperando por você! Você tem sorte de que eu não chame o Exército Prata agora!”
O velho virou-se e cuspiu. Então voltou apressado para sua carroça, chicoteando os seus cavalos.
Envergonhado, Thor lentamente recobrou-se do vexame e levantou-se. Olhou ao redor. Um ou dois transeuntes riam e Thor olhou para eles com desprezo fazendo-os desviar o olhar. Ele sacudiu o pó e esfregou os braços; seu orgulho estava ferido, mas seu corpo não.
Ele recobrou o ânimo ao olhar em volta, maravilhado, dando-se conta de que ele deveria estar feliz já que pelo menos tinha chegado muito longe. Agora que ele estava fora da carroça, podia olhar ao redor livremente e a vista era extraordinária: a corte se estendia até onde os olhos podiam ver. Em seu centro, erguia-se um magnífico palácio de pedra, cercado por imponentes muros fortificados; coroados por parapeitos sobre os quais, o exército do rei patrulhava em toda a sua extensão. Em todo o seu redor havia jardins verdejantes, perfeitamente cuidados, praças de pedra, fontes e bosques de árvores. Era uma cidade; e estava abarrotada de pessoas.
Por toda parte fluíam pessoas de todo tipo: comerciantes, soldados, dignitários – todos com pressa. Thor levou vários minutos para entender que algo especial estava acontecendo. Enquanto deambulava por ali, ele viu que faziam preparativos: colocavam cadeiras;levantavam um altar. Parecia que estavam se preparando para um casamento.
Seu coração disparou quando ele viu, à distância, uma pista de torneios, com seu longo e poeirento caminho e sua linha divisória. Em outro campo, ele viu os soldados atirando lanças em alvos distantes; em outro, arqueiros apontando para alvos feitos de palha. Era como se por toda parte houvesse jogos e torneios. Também havia música: alaúdes, flautas e címbalos, bandas de músicos perambulavam; e vinho, barris enormes sendo rolados; e comida, mesas sendo preparadas …Banquetes estendendo-se até onde a vista podia alcançar. Era como se ele tivesse pousado no meio de uma grande celebração.
Por mais maravilhoso que tudo isso fosse, Thor sentia a urgência de encontrar a Legião. Ele já estava atrasado e precisava apresentar-se.
Ele correu na direção da primeira pessoa que viu, um homem de idade, que parecia, por sua túnica manchada de sangue, ser um açougueiro, caminhando apressado rua abaixo. Todo mundo ali estava tão apressado!
“Desculpe-me, senhor.” Disse Thor, pegando- o pelo braço.
O homem olhou para a mão de Thor com desdém.
“O que é isso, rapaz?”
“Eu estou procurando a Legião do Rei. O senhor sabe onde eles treinam?”
“Por acaso eu pareço um mapa?” O homem retrucou asperamente e se foi resmungando.
Thor ficou surpreendido por sua rudeza…
Ele correu para a próxima pessoa a quem viu, uma mulher sovando uma massa em uma longa mesa. Havia várias mulheres à mesa, todas trabalhando arduamente e Thor tentava descobrir qual delas poderia saber.
“Desculpe-me, senhorita.” Disse ele. “Por acaso sabe onde a Legião do Reino costuma treinar?”
Elas se olharam entre si e riram, algumas delas eram apenas uns anos mais velhas do que ele.
A mais velha se virou e olhou para ele.
“Você está procurando no lugar errado.” disse ela. “Aqui, nós estamos fazendo os preparativos para as festividades.”
“Mas me disseram que eles treinam na corte do rei.” Thor disse confundido.
As mulheres desataram a rir novamente. A mais velha colocou suas mãos em seus quadris e sacudiu a cabeça.
“Você atua como se esta fosse sua primeira vez na corte. Por acaso tem uma ideia de quão grande é tudo isso?”
Thor ficou todo vermelho ao ver as mulheres rirem, então se marchou. Ele não gostava que se divertissem às suas custas.
Ele viu a sua frente uma dúzia de caminhos, torcendo e girando cada qual cruzando a corte do rei. Distribuídas entre os muros de pedra, havia pelo menos uma dúzia de entradas. O tamanho e a área deste lugar eram impressionantes. Thor tinha a triste impressão de que poderia passar dias procurando e mesmo assim não encontraria o lugar.
De repente, teve uma ideia: com certeza, um soldado saberia onde os demais treinavam. Ele estava nervoso por abordar um autêntico soldado real, mas percebeu que era isso o que deveria fazer.
Ele virou-se e correu para a muralha, para o soldado de guarda na entrada mais próxima, esperando que ele não o jogasse longe. O soldado erguia-se firme, olhando fixamente para a frente.
“Estou procurando pela Legião do Rei.” Thor disse, expressando a maior valentia possível em sua voz.